DEPRÊ.





A depressão não é o pior dos males humanos. É o último.

O que poderá vir depois? Urinar pelo nariz, ou tossir pelo ouvido?

O deprimido é antes de tudo um fiel ouvinte e leitor de todas as sessões de previsão meteorológica. Tempo bom significa:

-Merda... Vai dar praia!

Sol e calor levam o deprimido a pensar que ele não vai conseguir resistir àquilo.

Se for fim de semana, daqueles feriadões de quatro dias então, está armado a maior desgraça que um ser humano pode encarar.

Fica pensando e engendrando fórmulas mágicas para sair daquela terrível situação. Percorre na internet os estados nos quais estão previstas geadas, chuvas torrenciais, cataclismos meteorológicos.






Quando identifica, liga imediatamente, para a agência de viagem:

‑ Poltrona 10 Turismo, bom dia! Em que podemos servir? – Atende uma suave voz suave, feminina, programada para ser gentil e até escutar alguns impropérios se for preciso!

‑ Olha, você, tem passagem para Dom Pedrito, no Rio Grande do Sul?‑ pergunta nosso deprê, louco para se livrar deste inferno de mar e sol, maracanã e futebol.

Do outro lado um silêncio maior do que usual.

-Dom Pedrito, Sr?

-É Dom Pedrito...

-O Sr. tem acompanhado o noticiário, e as previsões do tempo para aquela região? - pergunta timidamente a atendente.

-Sim, tenho...

-Sabe o que é? -interrompe a atendente - todos os nossos clientes cancelaram as viagens porque lá em Dom Pedrito, no momento, onde não tem neve pela barriga, tem água até a cabeça.

Só estamos conseguindo pousar de hidroavião da FAB e, mesmo assim para mandar mantimentos para os flagelados - esclarece com uma voz, absolutamente, constrangida a senhorita da agência Poltrona 10 Turismo.

- Sim, eu sei, estou acompanhando tudo. No entanto, aqui no Rio tem previsão de feriadão de quatro dias, com muito sol, mínima de 39 e máxima de 42 graus, muita praia, aquelas mulheres todas bronzeadíssimas e seminuas na areia. Algumas até com os peitos, generosamente, de fora.

Além disso, aquele monte de homens morenos e sarados, correndo pra lá e pra cá, verdadeiros atletas bronzeados. Os cachorros mergulhando sem a menor cerimônia na. água, todas as redes de vôlei ocupadas, o frescobol comendo à solta. Pelo amor de Deus, me arruma uma passagem para Dom Pedrito! ‑ implora, nosso desesperado melancólico e irritadiço deprê.

Realmente, para quem gosta da escuridão, a luz ofusca a visão.

O deprimido gosta do escuro, do cinza, do silêncio, de pizza no sofá, de semanas seguidas sem mudar nada na sua rotina.

Se pudesse só acordaria na hora de dormir.

Lê todos os jornais e não lê nenhum. Ouve todas as noticias possíveis e não escutou nada! Vê todos os canais de uma vez, transformando, o controle remoto do seu televisor num verdadeiro gatilho de metralhadora talibã.

Se você quiser agradar um destes deprê, jamais se lembre da data do seu aniversário. Deprimido não aniversaria. Morreu mais doze meses.


Esportes radicais do deprimido é buraco, dama e xadrez os quais joga contra ele mesmo. Adora palavras cruzadas, revistinhas de passatempos com aquele monte de caça palavras, descubra a palavra, complete aqui e ali, mas sua diversão preferida é jogar forca.

Enfim, um porre!


Eventualmente, toma banho e pelando, urina várias vezes durante aquele calorão debaixo do chuveiro e reclama sozinho daquele cheiro forte do sabonete.

Então, espirra. Espirra muito.

Quando está vendo televisão chora em qualquer tipo de programa, até em anúncios de venda de imóveis, vive abraçado com os cachorros e quando toca o telefone, atende nervoso:

‑ Porra, já disse a todos vocês que eu não estou em casa!

E do outro lado:

-Então, quem é que está falando?
-É o rádio, o rádio, entendeu?– Em seguida apaga o celular, definitivamente!