Capítulo 6

                    AS ENTREVISTAS DA TV GOELA

No final destas entrevistas da TV Goela,será percebida efetivamente, a plena atuação do CONAREAL-Comitê Nacional pro-realidade , órgão do governo criado para desestimular qualquer assunto ou comentários entre os cidadãos sobre Hádeser ser o país do futuro ou qualquer outra insinuação que viesse a ferir aquilo que estava absolutamente, proibido naquele país e que, buscava orientar o povo para a realidade e não, ficar deitado em fantasias esplêndidas, por todo a eternidade.
A gravação é de ótima qualidade e nela pode-se compreender os conflitos internos daquela nação.


O cenário é uma humilde residência na periferia da cidade com algumas valas negras à porta. Magérrimos cachorros vadios circulam à procura  de qualquer coisa: um braço, uma perna, enfim, algo substancial e sanguinolento que pudesse lhes minorar a fome. Crianças aparentemente gordas, mas na realidade, patologicamente barrigudas, extraordinariamente implodidas por vermes das mais variadas categorias e espécies, com olhares carentes, exultam com a novidade da presença da Televisão naquela localidade.
Diz a entrevistadora que estávamos vendo a ciranda da miséria. A entrevistadoras da TV Goela aproxima-se do ancião octogenário e inicia a entrevista.

-Entrevistadora – Desde quando o Sr. Tem notícia de que Hádeser é o país do futuro?

-87 anos - Meu pai já escutava do meu avô uma história contada pelo meu bisavô que a ele chegou através do meu tataravô. Dizia que no “Grande livro dos Ancestrais – espécie de Bíblia dos Hadeserianos– havia menção de que o nosso país estaria predestinado a ser a maior nação do mundo. Nós acreditamos nisto, sinceramente! Para nós  Hádeser é a Terra Prometida. Minha mãe conta que quando eu nasci o Presidente da época, num discurso quente, explosivo e principalmente inflamado, por coquetéis Molotov, jogado em cima do palanque, afirmava aos operários da Região do DEF ,grandes centros metalúrgicos da região, cujas siglas eram das cidades: Delfinia, Enrycochas e Foice que: “nossos irmãos dos Estados Coesos acreditam firmemente ser esta nação predestinada a liderança do “Grande Continente” face às suas inesgotáveis potencialidades naturais, seu povo ordeiro e pacífico, conseqüência étnica singular da síntese de raças maravilhosas…”

Entrevistadora – Mas, esse negócio do Grande Livro dos Ancestrais é um blá-blá-blá inconcebível, cheio de ufanismos e otimismos exagerados, chega a ser herético...

-87 anos – É minha filha, e bota heresia nisto! Na minha idade lhe confesso, já perdi as esperanças de ver Hádeser como a  “Grande Nação”, sonho dos nossos antepassados. Mas, você ainda pode pegar- termina então com aquela frase fatidica.

E neste exato momento um cidadão entre em cena, um verdadeiro “armário” que dificulta a imagem face a imensa envergadura das suas costas. Era um agente MS (Máxima Segurança) do Comitê Nacional pró Realidade – Conareal, que invade indelicadamente o local, quebrando com uma portentosa porrada uma das câmeras na TV Goela. Some a imagem. Ouvem-se apenas gritos: “Traidor, velhaco, consumista descarado, retrógrado”, referindo-se obviamente ao otagenário naquele momento de ufanismo.Some também o som. É possível que tenha havido alguma abominável atrocidade! A gravação é omissa em relação aos fatos. Retorna a imagem. 
Agora o ambiente é calmo. A câmera percorre absorta lindos e verdejantes jardins. Parece que estamos numa escola ou faculdade. Agora vê-se uma grande placa onde está escrito: Universidade Nacional de Hádeser.
Na realidade, estamos no Centro de Veterinária. A repórter da Rede Goela de Televisão aproxima-se de um estudante baixo, gordo, barbudo com aparência de debiloide (mas, atenção, pode ser um gênio) e pergunta:

-Entrevistadora da Guela – Por que você escolheu veterinária?


-Estudante – Bem, eu queria ser Físico Nuclear mas teria que sobreviver vendendo aipim na feira. Depois pensei em ser Químico, fui desaconselhado pelo próprio Diretor da Faculdade. Pensei então em medicina, aí foram os meus  pais que proibiram dizendo que depois de formado eu seria um eterno endividado,pois o salário de médicos em Hádeser era desprezível e  nem me deixaram fazer vestibular…

                                                                                                   CONTINUA...

2 comentários:

Maria Helena disse...

Oi Paulo, não tenho dúvidas do sucesso do seu livro. O seu país do futuro(Hádeser), certamente, lhe trará muitas alegrias no presente. O convite a "brincar de fantasias literárias" é necessário para sobreviver emocionalmente diante do caos da realidade como você tão bem retratou quando diz:..."daquele senso de "'carioquismo"- que as balas perdidas não conseguem acertar-" Hádeser "é um devaneio. Um soluço intelectual..." Li com avidez pois, sobretudo, seu livro é um convite à reflexão e à atitude. Parabéns!

Abraços!

PAULO TAMBURRO. disse...

MARIA HELENA,

nossa como eu gosto de ser elogiado!!!
Não tenho pejo,nem pudor de declarar isto, pois faz parte da minha egolatria (kkkk) disfarçada em humildade circunstanciais.
Gosto mesmo, dá a impressão que a humanidade é absolutamente boa e os problemas nem existem.
Obrigado Maria Helena e meus mais afetuosos agradecimentos.Mesmo!
Abração carioca.