CENTRAL DE ATENDIMENTO OU NUNCA FUI TÃO "SENHOR" NA MINHA VIDA!




                                                            
Hoje já temos quem nos ouça. As empresas se estruturaram com sofisticados call-centers. Atendentes são treinadas, para além de chamá-lo de senhor exaustivamente e quem sabe, eventualmente, resolver seus problemas. Aliás, este era o caso. Meu cartão de crédito solicitado há vinte e sete dias, ainda não tinha chegado às minhas mãos. Então vamos aproveitar a tecnologia e a comodidade, colocadas à nossa disposição:
-Nagoya, boa tarde, em que posso servi-lo, senhor?
-Nagoya? É Nissei? – perguntei pra quebrar o gelo.
-Não senhor, Sansei. Qual o problema senhor?
-Eu nunca acerto... -respondi  com um sorriso amarelo e quase me desculpando.
-Em que posso servi-lo, senhor?- E ela queria mesmo atender este senhor aqui!
-É o seguinte, meu cartão de crédito ainda não chegou e eu já pedi há algum tempo.
-Pois não senhor. Pode me confirmar alguns dados, senhor?
-Quais?
-Nome do seu pai, nome da sua mãe, sua data de nascimento e número do seu CPF, senhor.
E então, eu disse tudo que sabia. Se mais não disse, é porque não fui perguntado.
-Obrigado senhor. Seu cartão de crédito é Estendido Premium, não é isso senhor?
-Estendido?
-Correto senhor, tem um chips amarelado, correto senhor?
-Deve ser, eu pedi e ainda não chegou, portanto não sei dos detalhes.
-Os detalhes são estes senhor. Então senhor, infelizmente não é aqui, só atendo cartões Econômicos, sem chips, senhor. Vou transferi-lo para o setor responsável, senhor.
-Nagoya...
Já era! Bem que tentei. Imediatamente outra atendente na linha.
-Meu nome é Ruth, boa tarde senhor, em posso servi-lo, senhor.
-Ruth da bíblia?-brinquei para quebrar um pouco minha tensão que já dava sinais de sobrecarga na minha rede de energia elétrica.
-Desculpe senhor, em posso servi-lo?
-É o seguinte meu cartão ainda não chegou é Estendido Premium, com chips, exatamente com o que você trabalha, segundo informou sua colega.
-Exato senhor. Pode me confirmar alguns dados, senhor?
-Confirmar não, eu posso reconfirmar, pois sua colega já me pediu.
-Desculpe senhor, mas é para sua própria segurança. Nome do seu pai...
Estava certo. Atualmente nunca se sabe quem é o interlocutor. E lá estava eu repetindo tudo de novo. Mas afinal era para minha segurança...
-Obrigado senhor. É com o titular que eu estou falando, senhor?
-É. Pensou que fosse o “Ricardão”?- Brinquei de novo e ela nem notou.
-Um momento senhor.
Após “uns momentos”...
-Senhor, quando o senhor, pediu o novo cartão, senhor?
-Tem uns vinte dias.

                                            



-Engraçado senhor, não consta no sistema, senhor.
-E que graça tem isto? – notem que desta vez eu fui às forras!
-Desculpe senhor, vou transferi-lo para o setor de emissão de novos cartões Estendido Premium, com chips, senhor.
-Mas Ruth?
Novamente, não consegui pegar e uma nova atendente, no entanto com a presteza habitual já se apresentava.
-Esther, boa tarde, senhor? Em que posso servi-lo, senhor?
-Como assim?O velho testamento está todo trabalhando aí. A bíblia está toda reunida aí?
-Como senhor, não entendi...
-Deixa pra lá...
-Em posso servi-lo, senhor?
E então, com já havia decorado direitinho o meu texto, disse-lhe tudo rapidinho.
-Ok, senhor pode me confirmar alguns dados, senhor?
-Não, não posso. Tenho amnésia, Alzaimer, arteriosclerose, e estou tendo um AVC- explodi sem ter mais saco para nada!
-AVC, senhor?
-E olha,Quer saber de uma coisa?
-O que senhor?
-Você podiam até me chamar de “brother”, “amigão”, “cara”, “mano”, “maluco”, ”tio”, mais cacete se resolvessem o meu problema,não teria problema
-Senhor...
 Fui mas rápido. Ela ficou falando sozinho.
Algum tempo mais tarde, já tendo me vingado suficientemente das atendentes, do sistema, do call-center, enfim, verifico que ainda estava com o mesmo problema. Que bobagem tinha feito, por um simples prazer, fui fazer minha atendente infeliz, com diria Jamelão no clássico: Matriz e filial.
Voltei a ligar:
-Jesus, boa tarde. Em posso servi-lo, senhor?
-Quem está falando?- perguntei incrédulo!
-Jesus, senhor!
-Senhor, eu? Quanta humildade sua!- respondi quase me ajoelhando.

Mas, finalmente exultante e agradecido aos céus pela dádiva concedida, tive a certeza de que agora sim, teria resolvido meu problema, e sem intermediários, pois, Deus é grande, Deus é pai! 

2 comentários:

Suzete Brainer disse...

Olá Paulo,

Excelente a tua narrativa, um caminho para o leitor
partilhar todo este processo desgastante numa
situação desta. Porém, o senso de humor é libertador
(ferramenta que transcende situações...), mesmo
quando a inusitada situação (piada destas operadoras...)
consome todo o humor, restando a faceta do humor na ironia
ácida... Tenho certeza que com o jesus tudo foi resolvido!...

Grata pela sua atenciosa visita no meu blog, com um
generoso comentário analítico. Também me proporcionando
conhecer o seu blog.
Apreciei muito a leitura aqui!!
Abraço.

PAULO TAMBURRO. disse...


SUZETE BRAINER,

não é sempre que o humor flui como gostaríamos e ao ver retificado esta vontade por uma generosa análise e critica positiva como você fez, temos a sensação que acertamos.

Obrigado pelo incentivo!

Um abração carioca.