Certas pessoas carregam consigo o eterno e sombrio medo de uma doença.
São os hipocondríacos que podem ser polivalentes,quando acreditam terem dezenas de doenças simultâneas e tomam muitos e variados remédios indiscriminadamente, sem a menor preocupação de se intoxicarem.
Porém, existe aquele que elege uma doença, e com ela convive muito tempo!
O Adamastor é um caso típico.Emprego bem sucedido em uma grande multinacional, tinha da empresa um plano de saúde que cobria até os seus pés em dias de frio. Era completo. E a generosa empresa ainda pagava-lhe também,os remédios,exames , enfim, uma verdadeira mãe médico-hospitalar!
Adamastor descobriu que era cardíaco, tinha sopro no coração, o que espalhava para todo mundo até com certo orgulho e uma cara de idiota sofredor e carente.
Sua mulher o deixou um ano depois.Dizia que ele não queria sobrecarregar nenhum músculo do corpo e ela cansou de esperar, por "aquele" músculo que ficava tão longe do coração dele e tão perto, das suas mais legitimas fantasias libidinosas, funcionar.E Adamastor... nada!
Então deu-lhe um pé no traseiro,pois ninguém é de ferro!
Seu médico mandava ele fazer exatamente, o contrário, mas Adamastor queria curtir aquele "sopro", como se estivesse dirigindo um carro Ferrari Testarossa e vermelha!
Cuidadosamente!
Se ele fosse um iatista a sua embarcação jamais sentiria calmaria no mar, pois um sopro nas velas destes barcos é tudo que se deseja.
Em festa de aniversário o seu sopro deixava a criança aniversariante sempre chateada, pois era ele quem sempre apagava todas as velinhas.
Tinha sopro de sobra!
Várias consultas por mês, exames caríssimos, remédios aos quilos, tudo patrocinada pela sua generosa empresa.
Sua conversa era uma verdadeira ventania, pois não tinha outro assunto.Com quem Admastor encontrasse ia logo perguntando ao pé do ouvido:
-Você também, também, tem sopro no coração?
Qualquer que fosse a resposta do interlocutor, Adamastor deitava falação sobre sua pior e “gravíssima doença”, cultivada com muito carinho amor e abnegação.
Andava feito um bonequinho de louça, devagar, respirando compassadamente e poupando o mais possível as suas energias.Sua alimentação era semelhante a dos coelhos ou urso-panda, exclusivamente folhas e legumes, pois nada podia forçar-lhe a digestão e quem sabe, possivelmente exigir muito do seu “sôfrego” e exagerado sopro do coração.Um belo dia Adamastor foi à cidade e passou embaixo de uma construção . Um andaime despencou-lhe na cabeça.Adamastor teve afundamento craniano e, segundos antes de morrer, pelos ferimentos fatais e irreversíveis sofridos,estas foram suas últimas palavras ao médico da ambulância em plena via pública:
-Doutor , muito cuidado,pois tenho sopro no coração!
Foram os seus últimos suspiros!