DESABAFO DO NOIVO: PÔ CARMEM LUCIA!


O casamento foi lindo! Foi tudo muito lindo! Dizem que as mulheres valorizam mais do que os homens o planejamento, as compras, as festividades, tudo que cerca aqueles momentos mágicos que antecedem ao "sim" da união matrimonial dos cônjuges.
Em parte, isto é verdadeiro, não totalmente, porque eu me emocionei muito com o nosso casamento. Mas, reconheço que realmente você o valorizou muito mais. Comprou tudo. Coordenou todas as despesas.
Quanto empenho!
Envolveu toda a sua a família. Verdadeiro trabalho em equipe. Só depois da lua de mel é que fui ver tudo direitinho, fazer as contas, cotejar.
E, como você valorizou Carmem Lucia!
Aquelas cinqüenta rosinhas de chocolate que a sua mãe sugeriu para que fossem oferecidas aos convidados quando eles saíssem da festa, custou mais do que o aluguel da igreja e o coral, com o órgão do padre e tudo. 
Lembra do meu sapato preto, importado da Austrália de couro de canguru, que você achou lindão? Então, daria para comprar uns cinqüenta pares com o dinheiro gasto naquelas singelas lembrancinhas de chocolate. Eu sei que foi uma amiga da sua mãe que nos vendeu, não foi? 
Se a gente não conhecesse bem a sua mãe, Carmem Lúcia, diríamos que ela levou, no mínimo, cinqüenta por cento de comissão naquela comprinha.
                                           
Foi muito caro. O pior é que eu vi crianças atirando aquilo umas nas cabeças das outras. Um duplo desperdício. Como você valorizou nosso casamento, Carmem Lucia! 
Aquela gorda que fez os pasteizinhos de queijo para tira-gosto a pedido do seu pai bebum, cobrou mesmo, aquilo tudo? Tem certeza que o seu pai só gosta de comer os pasteis dela? Fiz umas contas rápidas e o que pagamos por aqueles pasteizinhos safados e mirrados daria para a gente comprar uma pastelaria no estado que mais se come pastel: São Paulo. O pastelzinho tinha no máximo, o minimo de pastel. Uma coisa à toa que, nem tinha vento e, com uma bolinha de queijo muito acanhada lá dentro, do tamanho de um grão de feijão. Um roubo! Desculpe, mas é revoltante.
Outra coisa, Carmem Lucia: eu tinha alugado um carro conversível, do ano na agência de um amigo, uma semana antes, e no dia do casamento seu irmão cancelou e alugou o carro dele para nós, aquele Escort, vermelho 86, surrado. Eu não entendi. E nos cobrou o dobro do preço daquela limousine conversível que eu já havia contratado. 
                                                 


Olha, vou ao Procon. Temos que conversar, seriamente, com seu irmão Outra coisa, quem pediu aquelas empadinhas de camarão para sua prima? Confere aí, pois, eu duvido que ela tenha mandado as quinhentas encomendadas. Foram caríssimas, não tinham camarão e ela deve ter entregue, menos da metade do que nos cobrou. 
O Juninho, filho da Esmeralda berrava: - mãe devolve minha empadinha. Ela tomou da criança na mão grande. Todo mundo estava reclamando. Meu amor você valorizou demais, prestigiou demais seus parentes, foi muito mão aberta com a sua família. 
Você falou que o tapete vermelho iria da entrada da igreja até ao altar. Que tapete? Eu vi o padre em cima de um pequeno capacho vermelho. 
Roubaram o maldito do tapete, Carmem Lúcia? 
E o dinheirão que eu paguei por 20 quilos de pétalas de tulipas multicoloridas que seriam jogadas em cima de nós no momento do beijo, lá no altar. Pétalas? Minha cabeça ficou cheia de serragem e papel de jornal picadinho. Parecia desfile gay na avenida, Carmem Lucia. Ficamos todos emporcalhados com aquilo.
Não quis lhe falar nada para não quebrar o clima, mais até quando nos deitamos na nossa tão esperada alcova na lua de mel, você ainda tinha aquele embuste de enfeite, dentro da calcinha. Lembra-se que eu comecei a espirrar? Era serragem Carmem Lucia!Vê qual foi o seu parente que nos vendeu alho por bugalho. E o arroz que seria jogado quando entrássemos no carro? Jogaram alpiste e muito milho, na nossa cara. Parecia chuva de granizo. Eu paguei arroz agulhinha de primeira. Jogaram alpiste e milho. Alguma insinuação a você? Não é possível. Nunca vi tanto milho! 

Tudo isto seria perdoado, não fosse aquele episódio grotesco de você ,desde cedo,começar encher a cara com seu pai - aquele bebum inveterado -  e ficar em altíssimo, estado alcoólico mal a festa ainda ter começado.
Abraçava todo mundo com aquele bafo insuportável e, ao invés de cortar o bolo de casamento cortou a galinha assada, do prato que estava perto. 
Carmem Lúcia, quando você me ofereceu aquele pedaço de galináceo, ainda pediu para que eu não sujasse o terno com o chantilly! 
Carmem Lucia, e foi, exatamente, aquele seu deplorável estado de embriaguez que, não deixou você notar quando, no final da festa, saímos e seu irmão parou aquele maldito Escort 86 ,tipo vermelho cheguei, no tal hotel que seu primo nos reservou, dentro de um pacote turístico que incluía estada em Teresópolis por uma semana com café da manhã, almoço, lanche e jantar executivo com velas e outras coisas românticas como passeio de cavalinho e assemelhados.
Na verdade ele nos deixou num velho sobrado na Rocinha. Lembra-se que você dizia - nas poucas vezes que conseguiu acordar naquela noite do embuste - que seu primo tinha pensado em tudo, até nos fogos de artifício? 
Carmem Lucia, aquilo não era foguetório nenhum, e sim um intenso tiroteio de armas pesadas entre a policia e os traficantes do local. 
                                             
Como fui enganado!
Estou num estado deplorável e lhe deixando esta carta, porque já está amanhecendo, você ronca como uma porca, o tiroteio acabou e vou direto procurar meu advogado para anular este verdadeiro ato de terrorismo que vocês chamaram de casamento e, colocar sua família na cadeia. 
Carmem Lucia, caso você queira suicidar-se, deixo-lhe um vidro de chumbinho, na mesinha de cabeceira. 
Torço por isso. 
Adeus!