CENTRAL DE ATENDIMENTOS









Hoje já temos quem nos ouça. As empresas se estruturaram com sofisticados call-centers. Atendentes são treinadas, para além de chamá-lo de "senhor", resolver seus problemas. Aliás, este era o caso. Meu cartão de crédito solicitado há vinte e sete dias, ainda não tinha chegado às minhas mãos. Então vamos aproveitar a tecnologia e a comodidade, colocadas à nossa disposição:

-Nagoya, boa tarde, em que posso servi-lo, senhor?
-Nagoya? É Nissei?
-Não senhor, africana.
-Eu nunca acerto...
-Em que posso servi-lo, senhor?
-É o seguinte, meu cartão de crédito ainda não chegou e eu já pedi há algum tempo.
-Pois não senhor. Pode me confirmar alguns dados, senhor?
-Quais?
-Nome do seu pai, nome da sua mãe, sua data de nascimento e número do seu CPF, senhor.
E então, eu disse tudo que sabia. Se mais não disse, é porque não fui perguntado.
-Obrigado senhor. Seu cartão de crédito é Estendido Premium, não é isso senhor?
-Estendido?
-Correto senhor, tem um chips.
-Exato, tem chips.
-Então senhor, infelizmente não é aqui, só atendo cartões Econômicos, sem chips. Vou transferi-lo para o setor responsável.
-Nagoya...
Já era! Bem que tentei. Imediatamente outra atendente na linha.
-Ruth, boa tarde senhor, em posso servi-lo, senhor.
-Ruth da bíblia ?-brinquei para quebrar um pouco minha tensão que já dava sinais de sobrecarga na minha rede de energia elétrica.
-Desculpe senhor, em posso servi-lo?
-É o seguinte meu cartão ainda não chegou é Estenso Premium, com chips, exatamete com o que você trabalha.



-Exato senhor. Pode me confirmar alguns dados?


-Confirmar não, eu posso reconfirmar, pois sua colega já me pediu.
-Desculpe senhor, mas é para sua própria segurança. Nome do seu pai...
Estava certo. Atualmente nunca se sabe quem é o interlocutor. E lá estava eu repetindo tudo de novo. Mas afinal era para minha segurança...
-Obrigado senhor. É com o titular que eu estou falando?
-É. Pensou que era o Ricardão?
-Um momento senhor.
Após “uns momentos”...
-Senhor, quando o senhor, pediu o novo cartão, senhor?
-Tem uns vinte dias.
-Engraçado senhor, não consta no sistema, senhor.
-E que graça tem isto?
-Desculpe senhor, vou transferi-lo para o setor de emissão de novos cartões Estendido Premium, com chips, senhor.
-Mas Ruth?
Novamente, não consegui pegar e a nova atendente, no entanto com a presteza habitual já se apresentava.
-Esther, boa tarde. Em que posso servi-lo?
-Como assim?O velho testamento está todo trabalhando aí
-Como senhor, não entendi.
-Deixa pra lá...
-Em posso servi-lo, senhor?
E então, com já havia decorado direitinho o meu texto, disse-lhe tudo rapidinho.

-Ok, senhor vou precisar conferir sua documentação, senhor.

-Não, não posso. Tenho amnésia, Alzaimer, arteriosclerose, e estou tendo AVC.
-AVC, senhor?
-E olha, você podia até me chamar de “amigão”, “cara”, “mano”, “maluco”, ”tio”, mais se resolvesse o meu problema, sua incompetente...
-Senhor, senhor...
Desta vez eu tinha ido às forras. Fui mas rápido. Ela ficou falando sozinho.
Algum tempo mais tarde, já tendo me vingado suficientemente das atendentes, do sistema, do call-center, enfim, verifico que ainda estava com o mesmo problema. Que bobagem tinha feito, por um simples prazer, fui fazer minha atendente infeliz, com diria Jamelão no clássico: Matriz e filial.
Voltei a ligar:
-Jesus, boa tarde. Em posso servi-lo, senhor?
-Quem está falando?
-Jesus, senhor!
-Senhor, eu? Quanta humildade!
Exultante e agradecendo aos céus pela dádiva concedida, tive a certeza de que agora sim, teria resolvido meu problema, e sem intermediários, pois Deus é grande, Deus
é pai!

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